FOLHA DOS GANCHOS - COLUNISTA ELI DIAS CORREA - Filho de Chão

 COLUNISTA :  ELI DIAS CORREA

PROFESSOR, HISTORIADOR E FILÓSOFO


 

Filho do Chão

 

Eu venho...

Venho da guerra que me habita.

Daquela que ninguém vê, mas me consome,

feito brasas sob cinzas.

E mesmo assim...

ainda acredito na paz.

Na paz das crianças descalças,

a pular nas poças da rua,

como se fossem espelhos de céu caíram no chão.

 

Eu venho da alegria.

Sim.

Mas daquela que dói,

que aperta no peito, no instante exato em que o dia começa.

Chamo essa dor de vida.

E a vida...

ah, a vida é o espinho da flor mais bonita do meu jardim.

 

Venho também da ruína.

De um tempo em que tudo desaba,

mas ainda assim eu vejo beleza.

Não essa beleza de vitrine,

mas a beleza vã, distraída,

feita para enganar o cansaço dos meus olhos.

 

 

 

Eu venho do chão.

Do barro quente, da poeira que sobe e não volta.

Sou feito de tudo aquilo que desagrada.

E, por tantas vezes, me afoguei nos goles da tontura,

me perdi nas taças da ilusão,

me encontrei nas palavras simples de uma oração sussurrada, repetitiva das velhas igrejas.

Tudo...

Tudo miragem.

 

Venho da dor e do amor.

Ah, o amor...

esse que deixa marcas fundas nas tardes vazias da minha casa.

Mas não é por ele que eu continuo a escrever.

É pela dor.

Foi ela quem me ensinou a levantar,

a lavar o rosto, a resistir.

A seguir com a alegria...alegria amarga

de parir-me a cada manhã.

 

Nasço.

Renasço.

Morro.

E torno a nascer.

É assim que eu vivo:

morrendo toda noite,

renascendo no orvalho das manhãs.

 

Eu, filho do chão, do pó, da ausência,

descobri que viver

é morrer um pouco todos os dias.

Mesmo já tendo morrido,

lá atrás, quando o amor, sorrateiro,

me venceu em silêncio, destruindo minha pureza.

 

Viver...

Ah, viver é coisa grande.

Tão grande

que nem esta folha entende.

Nem esta caneta dá conta.

É peso demais

para palavra tão pequena.

Comentários

  1. Viver é para poucos, a maioria apenas existe. Parabéns por seus mergulhos poéticos. 💎

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  2. Parabéns, caro Eli, por seu poema profundo, reflexivo e filosófico!

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